Chuchumeca, em Macau: fofoqueiro, coscuvilheiro, noveleiro, mexeriqueiro

sem-titulo

Uma palavra bastante típica do português de Macau é chuchumeca, que significa fofoqueiro (como dizemos no Brasil) ou, como dizem em Portugal, coscuvilheiro.

Outro sinônimo usado em Macau (e também em Portugal) para quem gosta de falar da vida dos outros é noveleiro.

Em Macau, existe até o verbo, chuchumecar – presente em muitos textos escritos em Macau, sempre com o significado de falar da vida dos outros, fofocar, mexericar – e não, como ensina, errado, o Houaiss, como “murmurar” nem como “reclamar“.

O papiá, ou a doce papiação (quase portuguesa) de Macau

Como se sabe, Macau é uma cidade na China que até 1999 foi colônia portuguesa e que tem até hoje o português como língua oficial (embora menos de 3% de seus habitantes de fato dominem a língua). O que é menos conhecido é que, além do português (e do cantonês, falado pela maioria dos macaenses), existe uma língua única de Macau: o papiá ou papiação macaense: língua local derivada diretamente do português, com simplificações e adaptações diversas, mas que, aos nossos ouvidos, não deixa de encantadoramente familiar.

O papiá de Macau já está (ou estava) quase extinto, até que grupos de macaenses, como os do excelente vídeo a seguir, começaram a produzir conteúdo na língua, de modo a não deixar morrer a “doce papiação de Macau“. Confiram:

Comentários?

‘Durian’ – em português, durião: o fruto mais fedido do mundo

12983453_10207628723250211_4360857460083482897_o

Um leitor nos mandou, da Tailândia, a foto acima, em que se lê um tipo de aviso cada vez mais comum em diferentes países do sudeste asiático: a proibição de (entre outras coisas, como fumar)… comer durians. Pelo nome em inglês durian é conhecida a fruta considerada a mais fedida do mundo: de aparência intimidante por conta do seu grande tamanho (pesa entre 1 e 3 quilos) e com casca cheia de espinhos, é seu odor a sua principal característica: alguns descrevem seu cheiro como o de “meias suadas com carne podre”, outros de “alho adocicado com estrume de porco”. Consumida sobretudo por seu suposto poder afrodisíaco, o cheiro do durian é tão forte – e, dizem, com tamanha capacidade de atravessar paredes – que a fruta é proibida em meios de transportes, locais públicos e mesmo no interior de hotéis.

23162010308427

Mas é claro que o tal fruto tem um nome em português – e, como já falamos na publicação sobre o nome do Butantã, palavras portuguesas ou aportuguesadas não costumam terminar em “-an” -, até porque a tal fruta asiática é diariamente consumida num ponto do mundo onde se fala português: a bela Macau, na China.

Na página turística governamental da cidade de Macau, informa-se, em português, quais os locais da cidade onde se podem encontrar, por exemplo, pastéis de nata (os “pastéis de Belém”, como são mais conhecidos no Brasil), doces típicos portugueses, e também doces de durião. No principal jornal em português de Macau, O Clarim, colunista, ao criticar o mau cheiro dos ônibus macaenses, comenta não saberse era urina, ou se algum passageiro viajava com um durião escondido“.

Nem todos os dicionários trazem a palavra. O Aurélio sim: diz que a árvore de durião dá “frutos oblongos, grandes, esverdeados e espinescentes, com polpa alva e macia“, mas “de odor nauseabundo“.

 

Em português, a moeda chinesa é o iuane, não “yuan”

10-yuan-return-of-macao-to-china

Tem repercutido nas notícias a recente desvalorização do dinheiro chinês, o iuane. Alguns jornais, porém, cometem frequentemente o erro de “esquecer” o nome português da moeda, grafando, em inglês, yuanyuans ou yuanes. Não há motivo para não usar o termo aportuguesado: se os mesmos jornais escrevem sobre o dólar (e não “dollar”) e sobre o iene (moeda do Japão), e não yen, não faz sentido que ainda por vezes se deixem de usar a forma portuguesa iuane e seu plural iuanes – ambas devidamente registradas no Aurélio, no Houaiss, no Michaelis e no Dicionário Priberam e muito bem empregadas pela Revista Exame, pela Folha de S.Paulo, pelo Estadão, pela O Globo/Reuters, etc. É de notar que ambas têm obrigatoriamente um “e”, em português: iuane, não iuan, e iuanes, não iuans.

Pode-se simplesmente fazer a analogia com a já mencionada moeda do Japão, o iene (plural: ienes – em inglês, yens).

Em chinês mesmo, o nome da moeda é outro – renminbi, sendo “yuan”, na língua chinesa, a unidade de conta (por exemplo: “A menor nota de renminbi é a de um iuane”). Tal diferença inexiste em português, como inexiste na maioria das demais moedas do mundo (dólar é o nome da moeda e da unidade de conta; euro, idem; real, idem; peso, idem; etc.).

4619433_3_d0b8_des-billets-de-yuans-chinois_929a0edda1ad224d97bc3a2c4231c500

 

 

Quem nasce em Macau é macaense

macao103s-2003o

Quem nasce em Macau é o quê? Macau, como se sabe, é uma região administrativa da China, antiga colônia portuguesa, onde o português é língua oficial. Mas quem nasce em Macau é chamado como? Qual o gentílico de Macau?

Numa resposta rápida, o gentílico de Macau é macaense – única forma usada pelos próprios macaenses e pelo governo macaense (ver exemplos abaixo).

Uma consulta a muitos dicionários, porém, não responderia isso: a maioria dos dicionários traz, com o mesmo destaque (ou às vezes até mais) que a macaense, os “sinônimos” macaísta, macauenho, macauês, macauense; nenhuma dessas formas, porém, tem uso de fato.

Erram, nesse ponto, os dicionários: colocar essas opções todas como sinônimas seria o mesmo que colocar num dicionário que o gentílico referente ao Brasil pode ser indistintamente “brasiliano”, “brasilês”, “brasílico”, “brasilíada”, “brasílio”, “brasil”, “brasilense” ou “brasiliense” – sim, originalmente, “brasiliense” referia-se a todo o país – e, a rigor, ainda pode ser usado nesse sentido, mas todo brasileiro sabe que brasiliense, hoje, é usado quase exclusivamente apenas como gentílico de Brasília, a capital do país.

Como se pode ver, a língua portuguesa é riquíssima em sufixos que podem formar gentílicos, sendo exemplos: –ense (singapurense), –ês (neozelandês), –ano (moçambicano), –ão (afegão), –enho (panamenho), –ino (argentino), –ita (iemenita), -o (turco, líbio), –ol (mongol), –ota (cipriota), além de empréstimos como a terminação árabe -i (omani, somali, saarauí).

Assim, é comum que a um mesmo topônimo correspondam múltiplas formas gentílicas dicionarizadas – Houaiss, por exemplo, registra, como formas possíveis para o Vietnã “vietnamense”, “vietnamês”, “vietnamiano” e “vietnamita” – mas é esta última a única de uso efetivamente corrente em português. A abundância de formas atestadas em vocabulários e dicionários não implica haver o mesmo número de formas em uso prático e corrente.

Em regra, independentemente dos registros, uma única forma acaba por consolidar-se no uso geral da língua – como, em outro exemplo, acabou por ocorrer com “brasileiro”, que substituiu as demais opções acima listadas; ou com “português”, que substituiu variantes como portucalense; ou com “angolano”, em detrimento da hoje obsoleta “angolense”, ou “guineense” em lugar de “guinéu”, etc.

Da mesma forma, resulta no mínimo enganoso ensinar (como ensinam alguns livros, dicionários e gramáticas) que macaísta é gentílico de Macau – uma vez que, na prática, essa forma não é usada (sobretudo não em Macau). O gentílico consagrado referente a Macau, na China, é macaense (sem o “u”), forma invariável no feminino; e é a única forma usada (em português, é claro) pelo próprio governo macaense (como se pode ver aqui,  aqui, aqui, aqui ou aqui).