Regra de português: usa-se G (e não J) antes de E e I nas palavras vindas do árabe

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Na minha edição (de 2010) da Moderna Gramática Portuguesa, de Evanildo Bechara, imortal da Academia Brasileira de Letras, leio, na parte sobre a história da língua portuguesa, a palavra héjira – que, na verdade, se escreve hégira, como se pode ver em qualquer dicionário brasileiro ou português – inclusive no VOLP da Academia Brasileira de Letras e no dicionário do próprio Bechara.

Um errinho bobo, que serviria apenas para recordar-nos que mesmo os melhores gramáticos às vezes erram, mas que reforça a necessidade de recordarmos as regras seculares da ortografia portuguesa, que explicam por que se escreve hégira, e não *héjira.

Por alguns considerada arbitrária, a ortografia portuguesa é na verdade bastante coerente e tem algumas regras fixas, estabelecidas há séculos. Uma delas, que por razões misteriosas nenhuma gramática moderna traz e mesmo os nossos melhores linguistas parecem desconhecer (mas que, se conhecida, evitaria erros como escrever “héjira“) é a de que sempre se usam as sílabas “ge” e “gi”, e não “je” e “ji”, nas palavras portuguesas de origem árabe.

É uma lição que se podia ler já nas primeiras gramáticas da língua portuguesa, dos anos 1500 – quando o “g” e o “j”, aliás, se pronunciavam de forma levemente distinta; e por isso se convencionou o uso do “g”, antes de “e” e “i”, para representar a pronúncia árabe do som.

Mas isso não será uma regra que, passados tantos séculos, caiu em desuso? Não, de modo algum; basta olhar para qualquer palavra portuguesa de origem árabe com som “je” ou “ji”: álgebraalgemaalgeroz, algezira (ilha), algibeira, algibebeabencerrage, alfageme, auge, Argel, Argélia, gengibre, gergelimgibeiraginetagirafa, gizNégedeRígel, sagena.

Assim sendo, é bom notar que, na recém-lançada versão atualizada da gramática de Bechara, a palavra héjira já aparece devidamente corrigida para hégira.