Como escrever números ordinais em português: 1º ou 1.º? 2ª ou 2.ª?

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Em português, os números ordinais, como “primeira”, “sexto”, etc., podem ser escritos com uma combinação de algarismos e letras sobrescritas: 1ª, 6º, etc. Algumas fontes tipográficas inserem automaticamente um sublinhado à letra sobrescrita, o que é opcional.

Uma leitora aponta-nos para um blogue português supostamente dedicado a achar “erros de português” – já escrevemos aqui sobre o perigo desse tipo de gente: o prazer em achar erros é tamanho que começam a inventar erros que não existem, ou bem confundem estilo com gramática. O tal blogue aponta como “erro” abreviar “segunda” ou “sexto” como 2ª e 6º. E essa gente se leva a sério.

Segundo esse tipo de inventores de falsos erros, deveriam obrigatoriamente escrever-se “2.ª” e “6.º”, com um pontinho. Porque, de acordo com a torpe lógica deles, o ponto seria obrigatório para marcar que se trata de uma abreviação.

Sim, é verdade que um ponto em geral marca a supressão de algo numa abreviação: “Il.mo” era a grafia tradicional da abreviatura de “Ilustríssimo”, em que o pontinho ficaria no lugar de tudo aquilo que se suprimiu – nesse caso, “ustríssi“. O primeiro furo na lógica de quem diz que “segunda” só pode ser abreviado como “2.ª” é que, nesse caso, o pontinho não estaria representando coisa alguma. Ademais, esses inventores de erros são, como sói ocorrer, incoerentes: se obrigatório fosse marcar com um ponto os ordinais, igualmente obrigatório seria usarem pontos em todas as siglas – como, com efeito, se escrevia até não muito atrás: O.N.U, D.V.D., etc. Mas, incoerentemente, os mesmos que, contrariando todos os bons dicionários e gramáticos, querem inventar uma obrigatoriedade de se escrever “1.ª”, “aceitam” as grafias quase universais ONU, DVD, etc.

Como também sói ocorrer, esses blogueiros inventores de erros seguem uma regra “de português” que não existe em nem uma única gramática de português, em nenhum tratado da língua, e que – aí a ironia – contradiz o próprio Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

Sim, porque não apenas nossos melhores gramáticos e a própria Academia Brasileira de Letras estampam “3ª edição”, “4ª edição”, “5ª edição”, sem pontos, em suas capas – o próprio Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, instrumento oficial e legal regulador da ortografia da língua, assinado pelos representantes dos governos de todos os países lusófonos, foi inteiramente redigido com ordinais sem pontos – como se pode ver aqui, na versão original, assinada em 1990; aqui, na versão atualmente divulgada pela própria CPLP; ou aqui, no protocolo modificativo também assinado por todos os países lusófonos.

Em suma, o próprio Acordo Ortográfico em vigor não usa pontos nos cardinais.

De modo que dizer que escrever “quarta” como “4ª” é um erro de português não é sequer “ser mais realista que o rei”. É erro, mesmo.

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